"Naquele tempo, e talvez que ainda hoje”
A ironia do recuo histórico de Memórias de um sargento de milícias
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https://doi.org/10.61389/wrlem.v1i22.9058Palabras clave:
Memórias de um sargento de milícias, literatura brasileira, romance históricoResumen
“Era no tempo do rei”: o parágrafo de abertura de Memórias de um sargento de milícias, publicado entre 1852 e 1853, situa a ação do romance em um contexto histórico específico, o da transferência da corte portuguesa ao Rio de Janeiro, sob regência de d. João, em 1808. O fato justificaria parcialmente a recepção crítica inicial do romance de Manuel Antônio de Almeida, que o consideraria um romance histórico ou crônica de costumes já passados (Castro, 2013). Em seu influente ensaio “Dialética da malandragem”, Antonio Candido (2023), por sua vez, sugeriria que o tratamento do passado em Memórias se assemelharia mais à lógica dos contos de fadas, como se o “tempo do rei” pertencesse a um passado mitológico. Mais recentemente (Chauvin, 2006), haveria quem defendesse que o recuo histórico seria um recurso estratégico adotado pelo autor a fim de criticar seu próprio tempo sem sofrer represálias. Este artigo propõe uma leitura nesse sentido, acrescentando, porém, que o recuo histórico, constantemente ironizado pelo narrador, não é um mero subterfúgio, mas sim um componente fundamental para os objetivos do romance: mostrar que o Brasil, apesar das mudanças recentes, seguia o mesmo.
Citas
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