O horror vem de dentro: o abjeto e o corpo político em três contos de Mariana Enriquez
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horror, corpo, abjeção, ArgentinaResumen
Neste trabalho, pretendo analisar três contos da escritora de horror argentina Mariana Enriquez: Fim de curso, Nada de carne sobre nós e As coisas que perdemos no fogo, relato que dá nome à coletânea à qual pertencem os relatos deste primeiro livro de Enriquez traduzido no Brasil. Como cenário temos um país marcado pelo contraste social e pela violência crescente, de crises econômicas cíclicas e de um passado recente de terrorismo de Estado. Dos doze contos reunidos no livro, apenas um tem um homem como narrador. Nos demais, temos narradoras mulheres que se movimentam por bairros decadentes, casas vazias, ruas sem iluminação e povoadas por viciados, pedintes, prostitutas, traficantes. Os três relatos que analisarei são narrados por mulheres que escolhem, de uma maneira ou de outra, transformar os próprios corpos em anomalias, através de decisões pessoais, mas ao mesmo tempo coletivas ou motivadas por uma força sobrenatural não explícita. No primeiro relato, uma garota conta de uma colega de classe que começa a mutilar-se: primeiro arrancando as próprias unhas, depois os próprios cabelos, cílios e sobrancelhas, por fim, corta o próprio rosto e desaparece da escola. A ação de Nada de carne sobre nós começa quando uma mulher encontra na rua uma caveira humana, que leva para casa e apelida de Vera. Ao longo do conto, a protagonista afasta-se do mundo (namorado, mãe, amigos) e se aproxima de Vera, em um processo de identificação tão grande que decide, ao final, parar de comer e transformar-se ela mesma em uma caveira. Já no conto que dá nome ao livro, As coisas que perdemos no fogo, vemos o surgimento de um grupo de mulheres que se jogam em fogueiras para deformar o próprio corpo e assim protegerem-se do desejo e da violência masculinos. Elas buscam, como afirma a primeira das mulheres queimadas, criar uma nova sociedade, composta de homens e monstros. Nos contos analisados, o horror é criado a partir do corpo feminino, que se torna alheio, abjeto, espaço de dissidência e objeto de terror. As modificações corporais dos três relatos aparecem como um vírus ou uma epidemia, ao mesmo tempo em que se apresentam como resistência.Citas
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