Vol. 6 No 11 (2022): Políticas públicas: instituições, atores e ideias
O campo das políticas públicas nasce na década de 1950 nos Estados Unidos já com uma grande inclinação à multidisciplinaridade. Lasswell (1951) é o autor que inaugura e nomeia a disciplina de policy science (ciência da política pública) como uma subárea da ciência política. Nesse contexto, o campo nasce com a intenção de entender como e por que os governos optam por determinadas ações, em discussões desvinculadas dos debates sobre o Estado, mais comuns na tradição da ciência política europeia (Souza, 2006). Desde então, o campo das public policies é desenvolvido e fortalecido, constituindo-se como uma disciplina bastante consolidada na literatura internacional, objetivando explicar os fenômenos em políticas públicas destacando o papel dos atores, das instituições e das ideias (Howlett; Ramesh; Perl, 2013).
O conceito de política pública em si é multifacetado, podendo encontrar aspectos distintos a depender dos variados autores (Howlett; Ramesh; Perl, 2013). O conceito de Dye (1984) dá os principais elementos que convergem em todos os demais conceitos: política pública é aquilo que o governo decide ou não fazer. Tal conceito é importante porque nos situa em três parâmetros básicos. O primeiro deles é a noção de que é o governo o agente principal responsável pela produção das políticas públicas. Dessa forma, embora demais atores sejam importantes, o conceito coloca como pressuposto de que é o governo quem tem a prerrogativa legítima do policy-making, considerando o contexto democrático. Em segundo lugar, o conceito de Dye (1984) aponta que a política pública é fruto de uma escolha. Ou seja, essa concepção demonstra que a política pública não é um fim em si mesma ou uma solução única, ausente de possibilidades, mas sim dependente da escolha do governo, dentre várias alternativas possíveis. Por fim, o terceiro elemento diz respeito ao “fazer ou não fazer”. Tal concepção assume que a escolha por não fazer alguma coisa também tem força de política pública, tendo em vista que é uma escolha por não alterar o status quo e a trajetória política. Dessa forma, as omissões governamentais também precisam ser estudadas pelo campo de políticas públicas.
No Brasil, o campo tem um desenvolvimento mais tardio quando comparado ao contexto internacional: as políticas públicas passam a ser foco dos estudos somente entre as décadas de 1980-1990. As pesquisas desenvolvidas até meados da década de 2000 estavam direcionadas às possibilidades trazidas pela Constituição de 1988, sobretudo com relação às políticas sociais e à participação social (Melo, 1999). Porém, essas pesquisas são desenvolvidas de forma desordenada e sem uma agenda de pesquisa que dialogassem entre si de forma a fortalecer o campo e dar aprofundamentos teóricos; o que é observado, na verdade, são estudos de caso (Arretche, 2003). A década de 2010, por outro lado, é caracterizada por uma institucionalização de teorias e métodos de análises de políticas públicas, refletindo um desenvolvimento enquanto campo multidisciplinar (Marques; Faria, 2013), onde as produções e contribuições são fruto de vários campos de estudo, abrangendo áreas como Ciência Política, Administração Pública, Sociologia, Psicologia Social, Antropologia, Direito, Relações Internacionais, em diálogo com a literatura internacional.
Esta interdisciplinaridade coaduna-se com um movimento intrínseco ao campo de públicas, que é a necessidade do pensamento interdisciplinar para pensar um mundo em constante transformação, bem como promover mudanças substantivas na maneira como o Welfare State é organizado. Além disso, a disposição da agenda das políticas sociais também é influenciada pela maneira como os governos se organizam e se predispõem a resolverem os problemas imediatos, postos pela sociedade ou mesmo formulado no âmbito de suas pastas ministeriais.